Cientistas americanos descobriram uma nova técnica de descongelamento rápido de órgãos humanos
Cientistas americanos descobriram uma nova técnica de descongelamento rápido de órgãos humanos que poderá acabar com as filas de transplantes no mundo todo. O método elimina a necessidade de que corações e pulmões, por exemplo, sejam reimplantados em poucas horas. O corpo de um humano adulto é formado por cerca de 65% de água, substância essencial para a vida como conhecemos — mas algumas de suas propriedades, como a expansão no congelamento, se tornam grandes empecilhos às tentativas de usar a criopreservação (congelamento a baixíssimas temperaturas) para o armazenamento de tecidos vivos para futura utilização. Agora, no entanto, um novo método desenvolvido por pesquisadores liderados por John Bischof, da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, pode mudar este cenário e acabar com as filas para transplantes.
Atualmente, os órgãos colhidos dos doadores são mantidos apenas resfriados até que sejam transplantados nos receptores, o que limita o tempo, e distância, para a cirurgia. Coração e pulmões, por exemplo, só podem ser guardados assim por apenas quatro horas, enquanto fígado, intestinos e pâncreas duram de oito a 12 horas e rins, no máximo, 36 horas. Isso faz com que muitas vezes, mesmo sendo viáveis e compatíveis, estes órgãos acabem descartados, como acontece com 60% dos corações e pulmões.
E o problema nem é o congelamento em si. Desde a década de 1980, um processo conhecido como vitrificação usa compostos anticongelantes para evitar que a água contida em amostras biológicas forme cristais de gelo (que danificam os tecidos) na sua transição entre o estado líquido e sólido. Tanto que pequenas estruturas, como óvulos, células sanguíneas do cordão umbilical e mesmo embriões, já são amplamente criopreservadas por tempo indeterminado. Isto porque, devido ao seu tamanho microscópico, elas podem ser descongeladas rapidamente e de maneira uniforme.
O mesmo, no entanto, não acontece com estruturas maiores, como tecidos mais complexos e órgãos inteiros. Nestes casos, um descongelamento lento e assimétrico leva ao surgimento de cristais de gelo que rompem a organização e as células que os compõem, inutilizando-os. Assim, era preciso encontrar uma maneira de reaquecer tecidos e órgãos tão rápido e uniformemente quanto é possível congelá-los, o que os pesquisadores conseguiram ao acrescentar e distribuir de forma homogênea nanopartículas de óxido de ferro na solução usada para a vitrificação. Agitados por ondas eletromagnéticas, estes pequenos pedaços de metal — que depois podem ser facilmente “lavados” das amostras — elevam a temperatura dos tecidos de forma generalizada a uma taxa superior a 130 graus Celsius por minuto no processo de descongelamento, fazendo a água “saltar” a fase de cristalização, evitando danos.
Em experimentos conduzidos em laboratório, os cientistas conseguiram descongelar com 90% de sucesso tecidos com volumes de até 80 mililitros. E embora tal tamanho ainda esteja longe de abranger órgãos humanos inteiros como coração e pulmões, já é suficiente para incluir estruturas como as válvulas cardíacas e vasos sanguíneos de porcos, usadas na experiência, e que têm dimensões similares às humanas — um grande avanço frente ao volume máximo de amostras biológicas que podiam ser descongeladas com sucesso até agora, de apenas um mililitro.
— Esta é a primeira vez que qualquer um foi capaz de aumentar esta escala para sistemas biológicos maiores e demonstrar um aquecimento bem-sucedido, rápido e uniforme de centenas de graus Celsius por minuto de um tecido preservado sem danificá-lo — resume Bischof, engenheiro mecânico e biomédico da Universidade de Minnesota e autor sênior do artigo que relata o novo método, publicado na edição de ontem do periódico científico “Science Translational Medicine”.
ARMA TAMBÉM CONTRA O CÂNCER
Segundo os cientistas, com as nanopartículas de óxido de ferro o ritmo de aquecimento das amostras ficou entre dez e cem vezes mais rápido que o possível com métodos convencionais de convecção, em que o calor é distribuído pelo movimento circulatório de áreas quentes e frias. E embora ainda sejam necessárias melhorias para aumentar ainda mais a escala de descongelamento bem-sucedido de tecidos vivos com o novo método, para poder usá-lo com órgãos humanos, os pesquisadores estão otimistas de que vão conseguir. Eles já planejam experimentos com órgãos de roedores como ratos e coelhos para depois começar as experiências com órgãos de porcos e então chegar a órgãos humanos. Os cientistas destacam ainda que a tecnologia também pode ser usada além da criogenia, como, por exemplo, na geração de pulsos de calor extremos direcionados que matem células de tumores cancerosos dentro do organismo.
Fonte: O Globo
Autor: CESAR BAIMA